Ninguém é perfeito, claro. Conseqüentemente
meus queridos amigos também não o são. Vai daí que o destino ou quem sabe os
Deuses determinaram que uma muito, mas muito mesmo, querida amiga, seja uma
pessoa maldosa, sem o menor respeito por minha avançada idade e, para culminar
bruxa! Muito mais moça que eu, se intitula minha filha (pela idade até poderia
ser) com olhos numa herança que não existe. Mas como é bruxa, tenho pra mim que
poderá fazer com que eu ganhe a mega sena minutos antes de exalar o último
suspiro estabelecendo uma batalha judiciária com meus de fato filhos. Eles que
se cuidem porque ela tem poderes extraordinários como se verá no relato que ora
faço.
Esta pessoa tão especial, sem a qual minha
vida perderia muito da graça e das benesses que tem, acaba de me fazer passar
por um episódio altamente constrangedor gerado por uma de suas infames
bruxarias. Desde que não sou mais uma cidadã motorizada esta moça me transporta
de cá para lá e de lá para cá com uma dedicação e freqüência espantosas. É
verdade que quase sempre aproveita estes percursos para exercer sua maldade
fina e bem arquitetada me colocando numa situação complicada. Esta manifestação
de maldade sempre tem apoio em algum descuido meu ao dizer ou comentar
inocentemente alguma coisa. A bruxa amiga tem uma espantosa capacidade de
torcer tudo que digo ou faço. Não foi diferente há dias atrás.
Ao chegarmos ao portão de meu edifício eu
estava a ela informando que no dia seguinte à noite estaria em casa de um ex
colega, que mal conheço, para ver um projeto que ele estava desenvolvendo onde
haveria possibilidade de minha participação. Minha frase foi exatamente assim: vou pra casa dele por volta das sete. Já
fora do carro, a caminho do portão do prédio que o porteiro mantinha aberto
para possibilitar minha entrada, escuto sua voz que grita: você vai pra casa ou pra cama dele?
Evito olhar para o porteiro e passo desabalada em direção ao elevador
certa que de agora em diante não seria mais considerada uma velhinha a quem se
deve carinho e respeito.
No dia seguinte, debruçada sobre um modelo de
dados eu escutava os esclarecimentos do colega sobre o projeto quando sinto
estava se iniciando um dos episódios de queda de pressão de que sou acometida,
sempre sem aviso, de tempos em tempos. Para quem nunca assistiu e desconhece a
não gravidade do incidente pode parecer uma cena impressionante. Como a
primeira coisa que acontece é a perda total do áudio e do vídeo fiquei
impossibilitada de dizer a ele que iria passar em minutos. Ao ver-me muito pálida
e gelada, parecendo não dar acordo de nada o rapaz apavorou-se e tomou duas
providencias que se revelaram funestas: chamou um vizinho médico e levou-me para
cama dele!!!
Ao começar a voltar ao normal me dei conta de
que estava na famigerada cama, cumprindo o vaticínio da bruxa. Tive um ataque
de riso incontrolável. O médico explica ao rapaz: É riso nervoso! Você sabe, a idade... e para mim... fica calma, minha querida, vai passar já.
Meu ataque de riso aumenta. O médico fala como se dirigindo a uma criança: fica um pouco mais na caminha. Seu amigo
aqui vai ficar com você. Aí foi
demais e eu já estava chorando de rir. O médico sossega o rapaz explicando mais
uma vez que a provecta idade e o nervoso eram responsáveis por este
comportamento absurdo, que dentro de poucos minutos eu estaria bem e se vai.
Eu tento me levantar explicando que não
estava tendo um ataque de riso nervoso. Apenas havia me lembrado de uma coisa
muito engraçada que tinha relação com o episódio. Não convenceu. Mesmo porque
eu não podia contar o que havia ocorrido. O rapaz me olhava preocupadíssimo e
declarou que não tinha sentido continuarmos trabalhando. A esta altura percebi
que qualquer possibilidade de me ver incluída no projeto havia terminado ali.
Já o escutava telefonando irritadíssimo para o colega que havia me indicado,
este sim um amigo, dizendo: não deu. Ela
está completamente gaga. Como é que
você me indica uma pessoa destas?
A esta altura tudo que havia a fazer era ir
embora. Peço que me chame um taxi. Ele, educadíssimo se recusa: não tem a menor hipótese. Vou te levar em
casa e só deixo você em sua cama. Sou possuída de outro ataque de
riso. De novo ele, eu e a cama como
havia sido determinado pela bruxaria.
Aceitei a carona, mas não a colocação na
cama. Despedi-me na porta do prédio, com mil agradecimentos e de olho no
porteiro que abria o portão. Era certo que curioso conferia quem era o dono da
cama mencionada no dia anterior por minha poderosa amiga bruxa.
No dia seguinte, indignada, comunico à responsável
pelo incidente as conseqüências de sua previsão. Ela fica encantada com o
ocorrido. Tudo que lhe ocorre dizer é: sou
mesmo muito poderosa! Resignada
mantenho-me a espera do próximo episódio que na certa ocorrerá. O que consola é
que entre um episódio e outro posso desfrutar desta amizade tão especial.
Porque feitas as contas o saldo é pra lá de positivo.
2011
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