quinta-feira, outubro 17, 2013

CONFUSÕES HOTELEIRAS

Hoje em dia não são telefonemas que marcam a data.  A tripa de e-mails de amigos distantes e nem tanto me informam: dormi com uma idade e acordo com outra! Percorro os nomes sem abrir as mensagens que sei carregadas de verdadeiros e gostosos bons desejos. Como em todos os anos (e desde sei lá eu quando) uma me faz sorrir: a do pequeno hotel de Brasília onde, por mais de vinte anos, pairei em minhas constantes idas àquela cidade. Não me lembro quando por lá aportei a primeira vez e nem mesmo por que o escolhi. Provavelmente foi no desespero de encontrar vaga nos grandes hotéis, coisa quase impossível quando ocorre algum evento naquela cidade atraindo milhares de pessoas de outros estados. Mas o fato é que passou a ser o meu hotel. Mínimo, sem quaisquer mordomias tinha, no entanto, (e o mail me assegura que ainda tem) um staff extremamente simpático e acolhedor. 

Abro o mail sorrindo e o sorriso morre ao ler, em meio aos parabéns e bons votos, a terrível constatação de que por lá também serei sempre lembrada como “serial clumsy”:  ...saudades da hospede mais divertida que já passou por este hotel. E a dolorosa memória acorda: manhã de sexta feira os hóspedes se acotovelam no balcão tentando pagar a conta. Uma profusão de malas cobre o vestíbulo. Todos estão com pressa. Peço que guardem minha mala que será apanhada na ida para o aeroporto ao final da tarde. O mesmo faz o senhor ao meu lado. Finalmente consigo que me atendam e saio correndo para apanhar um táxi quando, já na porta uma mão segura meu braço. Com uma voz insegura e constrangida o senhor que estava ao meu lado no balcão declara: a senhora, por engano, pegou minha carteira. Indignada respondo: claro que não!  Do balcão vem a voz do gerente: D. Anna, eu acho que a senhora pegou, sim. Olha dentro da bolsa. Apavorada faço isto e lá está a carteira que eu jogo nas mãos do homem e sem pedir desculpas entro num táxi que já estava saindo com uma pessoa dentro. De novo sem me desculpar berro para o motorista, apavorando o freguês que já estava instalado: sai daqui, depressa! Como sempre acontece, quando apronto, passo dia entre horrorizada com o que fiz e aliviada de ter sido somente um incidente já que geralmente estes vêm em cadeia.

Ao final da tarde passo no hotel para pegar a mala. Da janela do táxi indico ao empregado do hotel: aquela ali e ele a coloca no banco da frente. Ao chegar ao aeroporto vou retirar a mala e horrorizada verifico não ser a minha. Peço ao motorista que volte ao hotel em disparada, levando aquela e trocando pela minha enquanto eu faço o “chek in”. Isto feito volto à entrada para esperar o raio da mala. Minutos depois lá vem o táxi com um passageiro: o homem de quem eu roubei a carteira e ao que tudo indica também a mala. Desmancho-me em desculpas diante do homem que sem falar me dirige olhares furiosos. Pego a minha mala e pago a dupla corrida. O motorista me informa: o homem tava que nem doido atrás da mala! 

Fico sabendo que o avião tem um atraso de 40 minutos e resolvo ir à livraria da UNB, sempre frequentada por mim. Pego um carrinho onde ponho a mala; melhor que ficar puxando aquela trolha. Passados em revista os novos lançamentos, resolvo ir fumar um cigarro lá fora. Encaminho-me para rampa e quando já ia descer encontro um ex-colega do SERPRO e paro para conversar soltando o carrinho que, com as duas rodas dianteiras já na rampa, despenca-se acelerando até atingir um senhor que sobe.  Este senhor é, como não poderia deixar de ser, a minha vítima do dia. Meu colega recupera o carrinho enquanto o senhor passa por mim dizendo em alto e bom som e furiosamente: inacreditável!

Na minha seguinte ida a Brasília todos no hotel já estavam cientes do ocorrido; Dr. Cristóvão – agora me informavam o nome – havia contado em prosa e em verso a desventurosa seqüência de infortúnios. Cruzei com ele todos os dias na mesa do café e nem tive meu “bom dia” respondido. Na sexta feira estamos os dois no vestíbulo para pagar a conta. Prudentemente ele espera que outras pessoas se coloquem atrás de mim para ingressar na fila. Na minha frente um hóspede portava um saquinho de plástico com um peixe vermelho nadando dentro. Que coisa esquisita, pensei. O que faz uma criatura às 7:30 na manhã, num hotel, com um peixinho? Não consigo atinar o motivo.

E chega a minha vez de ser atendida: confiro a nota e preencho o cheque. O atendente olha o cheque e começa a rir, passando o dito para a outra atendente que solta uma sonora gargalhada. A esta altura todos os que estão na fila, inclusive eu, curiosos observam. O Gerente olha por cima do ombro dos dois atendentes e apossa-se do cheque dizendo: D. Anna, por favor, faça outro cheque. A senhora escreveu: duzentos e cinqüenta reais e trinta e nove peixinhos! Sorrisos divertidos dos filantes e um ar de imensa incredulidade no meu senhor vítima. Evito fazer qualquer comentário e desconcertada, querendo desaparecer dali num passe de mágica, apressada, preencho outro cheque que provoca risos mais escandalosos. O Gerente engasgado declara: a senhora trocou os trinta e nove peixinhos por trinta e nove minutos!

2008

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