sábado, agosto 31, 2013

DE MICOS E JOGADORES DE FUTEBOL

Será que você pode me dizer quanto custa um mico de três meses? Irritada, num primeiro impulso, pensa em desligar o telefone. Mas dá-se conta de que é a única culpada. A curiosidade, a maldita curiosidade que a acompanha há oitenta anos, aliada às mais absurdas informações fornecidas pelos vizinhos de poltrona nos muitos trechos BSB/RIO ou RIO/BSB (BSB é Brasília), fazem com que sua já lotada cabeça deixe sair pelo ladrão declarações esdrúxulas que motivam gracinhas como esta.

Quem mandou deixar escapar em meio ao jantar, e ainda por cima, com veemência: vocês não devem alimentá-los! É péssimo porque...  e enveredou pela explanação sobre o mal feito de alimentar micos quando percebeu a expressão  divertida dos amigos. Calou-se, mas o estrago já estava feito. De nada lhe valeu na vida o alerta que sempre fez aos estagiários: excesso de informação não gera conhecimento.Deste mal acabou sendo a maior vítima. 

Mal o avião decolou o companheiro ao lado lhe confidenciou: sou veterinário especializado em animais silvestres. Pronto! Deixa dada, a curiosidade atacou e as perguntas surgiram seguidas de respostas extensas, elucidativas, técnicas e até poéticas. Os micos são monogâmicos! O que tem isto a ver? Sabe-se lá, mas o fato é que são e apesar de viver em bandos são fiéis às suas micas. E tem mais! Os pais é que cuidam do bebê após quatro dias de nascidos.

Sentiu-se culpada! No laptop o modelo de dados que inicia o desenvolvimento do novo sistema exigia retoques! Procurou, no passado, razão para justificar seu interesse maior pelos micos: seu velho professor de filosofia insistia que tudo tem a ver com tudo. Tentou relacionar os micos ao modelo para sossegar a consciência. Não conseguiu e teve que optar. Venceram os micos! Quando as rodas do avião tocaram a pista, apressada, ainda formulou uma pergunta. A resposta veio do alto. Ele já estava retirando a mala do compartimento de bagagem e deixando-a cheia de perguntas não formuladas sobre esta espécie.

Prometeu-se não olhar para o lado, na volta. Se ele falar (é sempre ele e não ela. Por que será?) vai polidamente informar que tem que trabalhar durante a viagem. Mas... ele abriu um jornal do Maranhão. Mostrou a foto de um gol iminente e aponta: esse jogador é meu! Foi-se por água abaixo o raio do modelo, agora mais complexo, e ela perguntou: é do seu time? Pergunta pequena, inocente, mas abriu um mundo de informações. O sujeito era agente de jogador de futebol. Vocês sabem quanto ganha um goleiro de um time do Maranhão? Eu agora sei! Eles, os jogadores, moram numa república. É mais barato, sabe? E se você, quer dizer, ele, for zagueiro dá mais chance de aparecer na mídia, em fotos, porque quando marca um jogador como o Teves, as câmeras estão sempre apontadas em sua direção. Mesmo que seja zagueiro de um time do Maranhão. E quando dá sorte de ser dono de um que vai para a Europa? Nossa! A comissão (20%) é em Euro!

Tentou, obediente a seus mínimos conhecimentos filosóficos do científico (é... estudava-se filosofia no científico) juntar esta informações aos micos e ao modelo. Na verdade teria que acrescentar a estas, as obtidas do taxidermista do trecho RIO/THE (THE é Teresina) cujo mercado é voltado para colecionadores e pesquisadores. Até que dá para juntar alguma coisa. Micos e taxidermista guardam uma clara relação e relação tem a ver com modelo. Embora não conheça, devem existir pesquisadores e colecionadores que necessitam de micos empalhados e certamente de um sistema informatizado para tratar as informações sobre os ditos cujos. Mas a prática da taxidermia seria criminosa se adotada, por um agente, em um zagueiro.

No trecho RIO/POA (POA é Porto Alegre) observa o jovem, muito jovem, que coloca o cinto a seu lado. Este não vai nem falar comigo! Maravilha! Coloca o laptop no colo, pronta para ação.  A voz vem simpática, até carinhosa: a senhora parece com minha avó ela também adora computador. Brinca o dia inteiro fazendo paciência!  Um grande alívio a invade. Nenhum perigo. Que ela saiba não existe “especialização avó”, o que lhe garante a não ocorrência de um manancial de novas informações.

A voz continua doce: estou indo para casa dela. Tranquila  pergunta: vai de férias? E na resposta, carregada de orgulho, o horror que se anuncia: não! Sou campeão de skates. Vou para uma competição! Já no hotel, exausta, tenta conseguir o merecido sono, preparando-se para as muitas reuniões do dia seguinte. Em vão: micos machos, com filhotes empalhados às costas, jogam um novo tipo de futebol sobre skates que são dotados com o centro de gravidade baixo e de pegada larga, o que lhes garante maior estabilidade! 

2007


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