sexta-feira, agosto 23, 2013

ONTEM...

Rio de Janeiro de 1945. A turma da praia de Copacabana era formada de três casais de namorados e um avulso: Marcelo. Colégio, guerra, beijos na boca, filmes de Hollywood e leitura de livros "proibidos", construíam a vida e os sonhos daquela meninada até que Maria do Socorro, prima de uma das meninas, vem para o Rio estudar. E nada mais foi como antes: Marcelo apaixona-se perdidamente por Maria e ela por ele. E foi uma reviravolta na vida daqueles meninos. Namoravam, sim, mas ainda não havia descoberto o amor. E aquilo de Marcelo e Maria era amor. Amor pra valer. Seria apenas mais um lindo romance: namoro, noivado e casamento, mas uma carta anônima é enviada ao arcaico pai de Maria. Furioso ele proíbe o namoro da filha com "aquele pilantra". Findo o ano escolar ela irá retornar ao Ceará. Até lá colégio interno e nos fins de semana só pode sair acompanhada pela Tia. A notícia deixou a garotada aterrada e Marcelo desorientado. O fim do romance os deixaria órfãos de amor. Era urgente, descobrir uma forma de impedir a separação. Mas, como? Até que numa conversa restrita aos rapazes, um lança a bomba: “emprenha ela! Ai tem que casar”. Foi um Deus nos Acuda. A reação indignada de Marcelo inicialmente é compartilhada pelos demais que aos poucos se rendem à evidência: é a única solução. Comunicam às meninas. Estranhamente estas exultam: é isto! Mas ai a coisa complicou. Dois problemas seriíssimos surgem: onde? Como ter certeza de que Maria ficaria grávida? A desinformação era total: virgens - as meninas; inexperientes – os rapazes. Além disto, Maria estava proibida de botar o pé fora de casa. Para solução criaram-se comissões já que o assunto era escabroso demais para ser discutido por um parlamento misto: a das meninas e a dos rapazes. Era ainda necessário que Maria, que não mais participava das reuniões, fosse consultada e concordasse com este passo tão radical. A prima faz a consulta. Emocionados, em baixo de cada uma das barracas meninas e rapazes são informado: ela disse sim. E Marcelo chorou. A comissão das meninas vai se ocupar de como ficar-se grávida certamente; a dos meninos do local. As soluções propostas, inicialmente beiram o absurdo:

-   Diz que vinagre é tiro e queda.
-   Pra tomar ou pra passar? 
-   Não sei!
- Um travesseiro em baixo pra ficar inclinada e o espermatozóide desce pela gravidade!
-   Você tem coragem de dizer espermatozóide na frente dos     meninos, quando for instruir Marcelo?
-   Dou um jeito.
-   Dentro de um carro.
-   Mais respeito! Você está falando da mulher que eu amo!

Finalmente um dos rapazes, a contragosto, confessa que um seu primo é dono de uma garçonnière. Duramente repudiado pelos amigos por ter escamoteado esta informação até aquela data torna-se, no entanto, o salvador da Pátria. Já têm o local. E uma das meninas, filha de médico, obtém do pai a solução “científica” para garantir a gravidez: a tabela de Ogino e Knauss. A prima eximia imitadora de assinaturas, habilidade que lhe valia sair da enrascada de péssimos boletins, produz um bilhete da mãe que permite a saída de Maria do colégio para ir ao dentista. E chega o grande dia. A garconníère é emprestada por apenas duas horas, à tarde. Na Americana, num consumo espantoso de sundaes de waffles com maple a turma espera aflita. Na imaginação deles, Maria e Marcelo são protagonistas de um filme. Trasvestidos nos atores preferidos de cada um desenrola-se uma tórrida cena de amor.

-   Ela levou camisola?
-   Não!
-   Xiiii!

Eles estão atrasados. Será que o Pai descobriu? Baixa o pânico. Um deles tem a horrível idéia: e se eles se suicidaram? E eles chegam. Mão na mão. Olhares, emocionados, tão emocionados, se concentram no rosto dos dois que apenas sorriem. Sem palavra eles deixam a chave na mesa e partem. Mão ainda na mão. O grupo, num silêncio mágico, segue atrás. Foi ontem... há sessenta e cinco anos. 

2010

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