domingo, setembro 01, 2013

KISS

Ao contrário do que possa parecer não passei a escrever em inglês para descrever um romântico beijo num apaixonado texto. KISS é uma vulgarização usada para resumir um princípio lógico defendido por ilustres filósofos e cientistas. Longe de significar beijo, nem mesmo é uma palavra. É uma sigla formada por iniciais de uma frase um tanto malcriada: “KEEP IT SIMPLE, STUPID”!

O princípio nela resumido é o da Navalha de Occan. Trocado em miúdos este princípio preconiza, de forma bem mais gentil do que KISS, que “na explicação de qualquer fenômeno devem ser eliminadas todas as premissas que não trariam qualquer diferença, atendo-se àquela estritamente necessária para explicá-lo”. Ou seja, é uma condenação à verborragia de que são acometidas algumas pessoas para explicar ou justificar um fato ou um acontecimento.

Vai ver o frade franciscano William Ockham, criador do Princípio, chegou a esta formulação por ter suportado intermináveis explicações desnecessárias de alguns fiéis sobre pecados cometidos, na tentativa de justificá-los, quando uma só bastaria.

São inúmeros os exemplos da existência de não seguidores do preconizado pelo Princípio da Navalha de Occan de que temos notícia na história da humanidade. Mas eis que, na atualidade, me chamou atenção um aspecto que ao frade passou despercebido.  Numa torrente de palavras algumas autoridades do legislativo, judiciário e executivo, em todos os níveis da administração pública, elaboram falas exaustivamente longas, pesadamente adjetivadas, carregadas de erudição, hermetismo e citações, tentando convencer os ouvintes que fenômenos notoriamente injustificáveis...  são justificados!      

Isto me faz chegar à conclusão de que o frade deixou de enunciar um corolário importante ao Princípio: “a pluralidade de explicações para um mesmo fenômeno pode, em alguns casos, constituir-se num artifício para impedir que se perceba tratar-se de fenômeno inverídico”. A intenção quando praticado este corolário é clara: levar os ouvintes ao desespero, vencendo-os pelo cansaço, impedindo a compreensão e o julgamento.  

Minha condição de total vadiação, desde que parei de trabalhar há sete anos, me faz assistir ou ler uma enxurrada dos mais variados depoimentos e pronunciamentos prestados por toda a sorte de indivíduos do bem e do mal: políticos, técnicos, policiais e autoridades diversas, baseados em absurdas e exaustivas premissas, comprovando o acerto do corolário que proponho.

O julgamento do Mensalão é um exemplo perfeito da não observação do Princípio. Com honrosas exceções alguns Ministros, encantados com o som de sua própria voz, nos levam à loucura. Espanta-me não ter lido em qualquer dos muitos comentaristas deste evento uma correlação da atuação de algumas das Excelências com o Princípio da Navalha de Occan. Salta os olhos. Nada justifica o desfiar de um manancial de argumentos embasados em centenas de Leis, Regulamentos e Posturas, citações de personalidades famosas, livros, fatos históricos e que mais sei eu, já que se certos em suas afirmações e convicções apenas um destes poderia justificar o que pretendem afirmar. A menos que, é claro, estejam exercendo a prática prevista no corolário. Ai sim é indispensável atordoar os seus pares e a sociedade. Mas longe de mim afirmar tal coisa!

Lamentei o destempero do Ministro Joaquim Barbosa, a quem muito admiro. Seria melhor ter-se calado agüentando o calvário com mais paciência. Admito a dificuldade de não reagir com violência diante do que estava ocorrendo, mas houvesse o Ministro recordado o enunciado do Princípio de Occan, elegantemente poderia murmurar um simples KIS, retirando o último S malcriado por desnecessário e até redundante. Afinal o som é o mesmo, não? E isto, convenham, soaria até delicado.  

2013     

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário