A senhora está
autorizada? A
pergunta da mocinha sorridente, mal sabe ela, dá um novo colorido à vida. Esqueço-me do que ali vim fazer e me espanto!
É isto! Havia me esquecido de que, como cidadã, sou “autorizada”. E que
sentimento bom é este. Digna de reconhecimento e respeito podendo e devendo
cobrar o que me é devido. O mal estar causado pelos últimos acontecimentos
parece diminuir. Como Luther King eu tenho um sonho: imagino os passantes, povo
como eu, portando, cada um deles, um cartaz colorido que os identifica: “eu sou
autorizado”. Autorizado a falar, a cobrar, a exigir o que nos é devido.
Creio que, também como eu, de há muito ninguém se dá conta de
que esta autorização existe. Impotentes nos vemos frente à tela ouvindo o tom
raivoso de autoridades que execram a conduta de policiais que exorbitam como
se nada disto lhes dissesse respeito. Colocam-se absurdamente como um de nós,
estarrecidos e surpresos com a ferocidade dos atos, como se estes não houvessem
sido gerados por sua administração, pela política de “enfretamento” que,
orgulhosos, divulgam em prosa e em verso no inicio de seus governos. Bandido
bom é bandido morto! Só que esqueceram de
treinar esta catastrófica tropa na abordagem destes bandidos. Vai daí que
“enfrentam” atirando a torto e a direito. E podia ser diferente? Se nem o
Governador foi treinado para exercer o cargo, o que esperar do preparo de um
soldado da PM?
A incompetência, gerada por nomeações políticas,
desconsiderando a capacidade técnica exigida pelos cargos, que já vinha
trazendo imensos prejuízos, agora produz vítimas. Por muito menos ministros e
até presidentes em priscas eras deixavam o cargo, envergonhados por sabedores
que eram da responsabilidade que lhes cabia. Conheciam eles um dos princípios
básicos que rege a ocupação de um cargo de direção: responsabilidade não é delegável. Se esta falha ocorre se impõe
resignar, envergonhado, pedindo desculpas.
O pior é que além da incompetência, me parece, existe também
a burrice. A palavra é grosseira, eu sei, mas o primarismo das explicações e
declarações feitas a denunciam e impossibilitam o uso de outra mais leve. E,
como já disse ao início, hoje estou me sentindo autorizada. A declaração dos
dirigentes de que muito têm feito, muito tem trabalhado, muito tem produzido,
me remete a um “causo” ocorrido há muitos anos, na Inglaterra.
Corria a segunda grande guerra e Montgomery enfrenta com
maestria a campanha da África contra forças muito mais poderosas do que as que
dispunha, saindo vencedor. Embasbacada a imprensa aliada o entrevista buscando
descobrir qual o segredo. Convicto ele declara: “o desempenho de meus
oficiais”. Ai outro mistério se apresentava: como em meio aquela terrível
guerra, que gerava uma enorme quantidade de baixas, ele conseguia obter, a
tempo, os substitutos que garantiriam a manutenção de um corpo de oficiais de
notável desempenho?
E, para pasmo de todos, veio a explicação, de uma
simplicidade meridiana, mas de imensa sabedoria: sempre baixas ocorriam e
exigiam substituição imediata ele solicitava ao Comando Central que lhe
enviasse os possíveis substitutos acompanhados de sua folha de serviço. Esta,
como de costume em todos os exércitos, era extremamente detalhada mostrando
todas as realizações e trabalhos feitos ao longo da vida militar. A simples
leitura permitia a Montgomery classificar os candidatos em dois grupos, assim
nomeados: trabalhadores e vadios.
Após esta leitura e classificação, Montgomery fazia com que
cada pretendente passasse 24 horas colado a ele conversando sobre assuntos os
mais diversos. Isto levava a uma segunda classificação: inteligentes e burros. Isto feito encontrava-se ele munido de quatro binômios que atribuídos de acordo suas observações permitiam encontrar o
lugar perfeitamente adequado para cada candidato visando o melhor desempenho.
O Inteligente Vadio
era talhado para agregar-se ao Estado Maior da Tropa onde certamente teria
brilhantes idéias que permitiram conseguir a melhor estratégia de ação... e
muito pouco trabalho. O Inteligente
Trabalhador mostrava-se o mais adequado para exercer funções de comando de
tropa onde o trabalho era insano, além de exigir decisões acertadas que
deveriam ser tomadas tempestivamente. O Burro
Vadio era perfeito para fornecer a massa mínima de oficiais necessária para
repassar ordens superiores sem discuti-las. Mas o Burro Trabalhador era imediatamente devolvido, banido, rejeitado.
É inimaginável a
quantidade de absurdos que é capaz de cometer em tempo recorde e antes que se
possa impedir -
disse Montgomery - é a classificação mais
danosa que pode ocorrer em uma instituição. É um elemento de extrema
periculosidade.
Munida desta “autorização” que hoje me confiro gostaria de
exigir a adoção de um sistema similar para o preenchimento dos quadros
governamentais em todas as esferas. Infelizmente me deparo com uma enorme
impossibilidade: quem faria o papel de Montgomery já que os que poderiam
selecionar os demais parecem estar incluídos na pior classificação?!
2008
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