quinta-feira, setembro 12, 2013

A ATUALIDADE DA LIÇÃO DE MONTGOMERY

A senhora está autorizada? A pergunta da mocinha sorridente, mal sabe ela, dá um novo colorido à vida.  Esqueço-me do que ali vim fazer e me espanto! É isto! Havia me esquecido de que, como cidadã, sou “autorizada”. E que sentimento bom é este. Digna de reconhecimento e respeito podendo e devendo cobrar o que me é devido. O mal estar causado pelos últimos acontecimentos parece diminuir. Como Luther King eu tenho um sonho: imagino os passantes, povo como eu, portando, cada um deles, um cartaz colorido que os identifica: “eu sou autorizado”. Autorizado a falar, a cobrar, a exigir o que nos é devido.
Creio que, também como eu, de há muito ninguém se dá conta de que esta autorização existe. Impotentes nos vemos frente à tela ouvindo o tom raivoso de autoridades que execram a conduta de policiais que exorbitam como se nada disto lhes dissesse respeito. Colocam-se absurdamente como um de nós, estarrecidos e surpresos com a ferocidade dos atos, como se estes não houvessem sido gerados por sua administração, pela política de “enfretamento” que, orgulhosos, divulgam em prosa e em verso no inicio de seus governos. Bandido bom é bandido morto! Só que  esqueceram de treinar esta catastrófica tropa na abordagem destes bandidos. Vai daí que “enfrentam” atirando a torto e a direito. E podia ser diferente? Se nem o Governador foi treinado para exercer o cargo, o que esperar do preparo de um soldado da PM?
A incompetência, gerada por nomeações políticas, desconsiderando a capacidade técnica exigida pelos cargos, que já vinha trazendo imensos prejuízos, agora produz vítimas. Por muito menos ministros e até presidentes em priscas eras deixavam o cargo, envergonhados por sabedores que eram da responsabilidade que lhes cabia. Conheciam eles um dos princípios básicos que rege a ocupação de um cargo de direção: responsabilidade não é delegável. Se esta falha ocorre se impõe resignar, envergonhado, pedindo desculpas.
O pior é que além da incompetência, me parece, existe também a burrice. A palavra é grosseira, eu sei, mas o primarismo das explicações e declarações feitas a denunciam e impossibilitam o uso de outra mais leve. E, como já disse ao início, hoje estou me sentindo autorizada. A declaração dos dirigentes de que muito têm feito, muito tem trabalhado, muito tem produzido, me remete a um “causo” ocorrido há muitos anos, na Inglaterra.
Corria a segunda grande guerra e Montgomery enfrenta com maestria a campanha da África contra forças muito mais poderosas do que as que dispunha, saindo vencedor. Embasbacada a imprensa aliada o entrevista buscando descobrir qual o segredo. Convicto ele declara: “o desempenho de meus oficiais”. Ai outro mistério se apresentava: como em meio aquela terrível guerra, que gerava uma enorme quantidade de baixas, ele conseguia obter, a tempo, os substitutos que garantiriam a manutenção de um corpo de oficiais de notável desempenho?
E, para pasmo de todos, veio a explicação, de uma simplicidade meridiana, mas de imensa sabedoria: sempre baixas ocorriam e exigiam substituição imediata ele solicitava ao Comando Central que lhe enviasse os possíveis substitutos acompanhados de sua folha de serviço. Esta, como de costume em todos os exércitos, era extremamente detalhada mostrando todas as realizações e trabalhos feitos ao longo da vida militar. A simples leitura permitia a Montgomery classificar os candidatos em dois grupos, assim nomeados: trabalhadores e vadios.
Após esta leitura e classificação, Montgomery fazia com que cada pretendente passasse 24 horas colado a ele conversando sobre assuntos os mais diversos. Isto levava a uma segunda classificação: inteligentes e burros. Isto feito encontrava-se ele munido de quatro binômios que atribuídos de acordo suas observações permitiam encontrar o lugar perfeitamente adequado para cada candidato visando o melhor desempenho.
O Inteligente Vadio era talhado para agregar-se ao Estado Maior da Tropa onde certamente teria brilhantes idéias que permitiram conseguir a melhor estratégia de ação... e muito pouco trabalho. O Inteligente Trabalhador mostrava-se o mais adequado para exercer funções de comando de tropa onde o trabalho era insano, além de exigir decisões acertadas que deveriam ser tomadas tempestivamente. O Burro Vadio era perfeito para fornecer a massa mínima de oficiais necessária para repassar ordens superiores sem discuti-las. Mas o Burro Trabalhador era imediatamente devolvido, banido, rejeitado.
É inimaginável a quantidade de absurdos que é capaz de cometer em tempo recorde e antes que se possa impedir - disse Montgomery - é a classificação mais danosa que pode ocorrer em uma instituição. É um elemento de extrema periculosidade.
Munida desta “autorização” que hoje me confiro gostaria de exigir a adoção de um sistema similar para o preenchimento dos quadros governamentais em todas as esferas. Infelizmente me deparo com uma enorme impossibilidade: quem faria o papel de Montgomery já que os que poderiam selecionar os demais parecem estar incluídos na pior classificação?!


2008

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