quinta-feira, dezembro 26, 2013

PAPAI NOEL ICONOCLASTA

-    Olá! Por aqui de novo? Logo hoje!
-    Preciso de ânimo! No ano passado aquela ceia de fim de noite que você me proporcionou, foi tão legal! Vai daí que pensei em passar para uma conversinha.  Como sempre você deixou a janela aberta! Uma imprudência. 
-   Você tem razão, mas esta trancação a que hoje nos obrigam é tão desagradável, né? Por lá vocês não têm este problema, não é?
-   Pensa você! A fábrica de brinquedos vive trancada. Depois que acabaram com o limbo as criancinhas invadem e fazem uma bagunça que só vendo. Mas sem violência, é claro.  É só uma travessura. Como vão as coisas por aqui?
-     Vão como Deus é servido. Mas Ele não tem se servido muito bem, ultimamente.
-      Tô sabendo. Dá um desconto, filha. Você não imagina o trabalho que dá esta humanidade. Mesmo sendo onipresente e onisciente é uma tarefa hercúlea dar conta de tudo.
-      Hercúlea?! Hércules é um semi-deus pagão! Você não devia aplicar este adjetivo a Ele! 
-      Mas Hércules era um homem do bem!
-      Mesmo assim! ... Você conhece?
-      Quem?
-      Hércules. Vai me dizer que ele anda por lá!
-     Ah! Conheço, sim. È um bom sujeito. Um tanto bronco, mas bem intencionado. Foram feitas algumas concessões para os que viveram na época AC. Afinal eles não tinham como saber da Verdade. Mas não sai contando isto por ai. Pode dar uma confusão do diabo! Perdão! O “diabo” escapuliu!
-     Imagina! Conto não. Fica tranqüilo. Mas quer dizer que todos aqueles gregos estão por lá? Mesmo os Deuses?
-      Você está querendo saber demais.
-   Desculpa! Mas a ideia é fascinante. Fico imaginando como...
-      Pois pára com isto!  Imaginação demais faz mal.
-     É que quando eu era criança - eles - os deuses gregos, eram meus ídolos.
-      E não são mais?
-   Acho que não! Nestes últimos tempos meus ídolos andam sendo destruídos.
-     Os meus também.
-    Você tem ídolos?! Como é que pode?! Você é santo! Ou melhor, seu alter ego é: São Nicolau, não é?
-   Esta minha dupla personalidade permite. Como Papai Noel posso me dar ao luxo de algumas derrapagens. Ídolos estão cada vez mais raros. Veja só o Ronaldinho! Não está jogando nada. Eu mesmo estou sendo destruído por aí afora. Poucos acreditam. De certo modo têm razão. Fiz por isto. Ou melhor, não fiz. Nesta de dar brinquedos deixei de lado coisas mais importantes. Vai daí que estou me tornando um iconoclasta de mim mesmo.  É pirante, não é?
-     Se é! Mas eu ainda acredito em você. É um dos poucos que sobraram. Preciso acreditar para que Maria Clara não se decepcione tão cedo.
-     Sua neta menor, não é?
-     Ela mesmo.  Preciso que você exista para ela.
-     E para você, não?
-   Claro que sim. Mas seria esperar demais. Ando me contentado com pouco. Se tiver para ela já é de bom tamanho.
-     Ah! Além dos deuses gregos, ao longo da vida, quem eram os outros?
-      Muitos. E foram sendo destruídos um a um, ingressando numa categoria a qual você me apresentou quando eu tinha seis anos.
-      Eu?! Não me lembro. Do que se trata?
-      Um livro. No Natal de 1936. Max und Moritz. Eu adorava a história daqueles meninos terríveis. Você me deu no original alemão, o que foi uma grande sujeira. Acho que você quis agradar a Fräulein.  
-    Lembro-me agora! Foi para agradar a Fräulein, sim. Você atormentava a vida dela. Era um pequeno demônio. Ai,ai,ai! Escapuliu de novo! Mas o que este livro tem a ver com este negócio de categoria?
-  Uma frase da qual nunca me esqueci. Um dos personagens descrevia os meninos assim: “por fora bela viola; por dentro pão bolorento”. Os meus ídolos andam se transformando em pães bolorentos.
-     Que horror! Mas é verdade! Vai daí quem sabe a gente consegue reverter isso. O por fora não tem muita importância; mas o por dentro pode virar pão doce. Preciso começar a trabalhar neste sentido.
-      Deus te ouça!
-      É verdade! Tá na hora Dele fazer isto!
2006




Nenhum comentário:

Postar um comentário