Desde muito jovem aprendi a conhecer as
pessoas pelo que fazem e não pelo que falam. Não que a maioria seja mentirosa.
Longe disto. O que ocorre é que um grande número delas se auto-engana e quando
falam refletem o que queriam ou acham que deveriam ser e não o que são
realmente “são”. Já quando na trajetória da vida a história é outra. Esta
ambigüidade é muito presente nas que se dizem enfaticamente independentes: sou totalmente independente. Caramba!
Fosse isto possível esta pessoa seria provida até de um sistema de coleta e
eliminação de lixo! Porque é inegável a dependência de todos da existência de
lixeiros e garis.
Este é apenas um mínimo exemplo de milhares
de seres dos quais dependemos. Isto no campo material. No campo dos sentimentos
a dependência, em alguns casos, é indispensável. Amigos, cônjuges, filhos,
artistas, escritores, músicos e que mais sei eu, tornam a vida mais bela por
existirem e deles dependemos para poder viver em toda sua plenitude o amor, a
amizade, a alegria e o encantamento do belo.
Mas o que chama atenção é que estes
“independentes” confessos muito freqüentemente de independentes têm apenas o
discurso. No mais, para existirem, são dependentes das mais diversas
circunstâncias. Na verdade são pessoas que seriam inexistentes caso “coisas”
exteriores não existissem. Ou seja, vivem vida de outros ou então de fatores
externos e não do que valem em si mesmos. Se lhes forem tirados estes fatores
ou estas pessoas tornar-se-iam um nada. Porque nada construíram de seu.
Pessoas verdadeiramente independentes não só
tem consciência de que não o são totalmente como tem a de ser, em si, alguém.
Podem lhes ser retirados todos os atributos externos e continuam ser. Jamais
farão das tripas coração para agradar aqueles de quem “dependem” (mas negam
depender) ou para permanecer na situação ou circunstância que lhes fazem “ser”.
Têm-se um exemplo primoroso disto naqueles que proferem indignados: você sabe
com quem está falando? Eles não poderiam dizer isto se lhes fosse tirado o
título ou o cargo. Mas eu, e espero que você que me lê, podemos dizer isto em
qualquer circunstância porque “somos”. Mas não dizemos porque não precisamos
deste escudo falso e de má qualidade para atestar que “somos”.
Um dos meus ídolos da juventude (e ainda!)
foi Humphrey Bogart. Personagem real de um episódio que ilustra este “ser”. Sid
Luft, então marido de Judy Garland era vizinho de Bogart e havia comprado um
Rolls-Royce. Além disto, lhe conferiam importância a mansão em que morava, um
mordomo inglês, sapatos idem e mais um monte de coisas exteriores. Numa festa,
em Hollywod, Sid perorava sobre a “classe” que lhe era conferida por estes
acessórios. E Bogart, impiedoso, comentou: classe
não pode se comprada ou adquirida como um bronzeamento perfeito. Eu posso
afirmar que você não a tem, nem nunca terá. Eu sei do que estou falando porque
nasci com ela. Conservei-a a vida toda e posso até passar sem. Bogart
nascido em berço de ouro (seu pai era um médico famoso e sua mãe uma artista
plástica de sucesso, ambos de famílias tradicionais) sabia que nada disso
conferia a ele, ou a quem quer que seja, alguma importância. O que importava
era o que de fato era, como pessoa. E isto em qualquer circunstância nunca lhe
poderia ser tirado.
Pode-se e se deve ter encantamento, por
exemplo, de pertencer a uma família ilustre em que membros se distinguiram por
alguma razão, mas a verdade é que isto não confere a alguém qualquer
importância se este alguém não tiver uma sensação interior de sucesso (este não
precisa ser atestado por outros) conseguida por seus atos e feitos durante a
vida. Comparação com quem quer que seja nunca tem sentido. A única comparação
válida é consigo mesmo: quanto eu andei; quanto eu fiz, quanto eu consegui em
“ser”. E é isto que nos torna independente. É isto que nos torna alguém capaz de admirar a si mesmo.
2011
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