Hospedou-se esta semana aqui em casa um
colega com quem trabalhei nos idos de 1998, em Brasília. E, como sempre
acontece quando velhos colegas se encontram, a conversa foi alimentada pela
memória. Às gargalhadas recordamos um episódio que ficou nos anais do Nead –
Núcleo de Estudos e Desenvolvimento Agrário. Por lá era comum a presença de
consultores de outras nacionalidades. Entre estes um agrônomo chileno,
extremamente simpático e competente. Desrespeitosamente o chamávamos
“Cucaracha”, evidentemente não em sua presença.
Teria sido impossível contar esta história
não fosse a prodigiosa memória de meu ex-colega responsável pela reprodução de
todas as falas: uma bela manhã, na sala onde quatro de nós estávamos
trabalhando, me vi sem grafite para a lapiseira. Nenhum dos presentes tinha
para emprestar. Lembrei-me de ter visto o Cucaracha reabastecer a sua. Levanto-me, falando alto: vou pedir grafite ao Cu... e apavorada
interrompo a frase nesta trágica sílaba ao ver que o próprio entrava na sala.
Marotamente um dos colegas presentes dá início ao absurdo diálogo que se
seguiu:
Colega 1 Vai
pedir a quem?!
Em
desespero rezo para que o Cucaracha que nunca conseguiu se expressar em
português ignore a grafia correta da primeira palavra que me vem à cabeça para completar
a maldita frase:
Eu Ao “cuzinheiro”.
Colega 1 Cuzinheiro?!
Cucaracha De
que cocinero habla usted?
Agora
preciso encontrar alguma explicação que possa justificar o absurdo
“cuzinheiro”.
Eu A
gente estava falando de comida. É que eu estou morta de fome.
Cucaracha Estas sin desayuno desde quando
desperto? Pobrecita!
Colega 2 A pobrecita tá é doida e sem grafite.
Cucaracha E
por eso tiene hambre?!
Colega 2 Tudo indica...
Cucaracha Curioso!
Colega 3 Põe curioso nisto!
Eu Você tem grafite que possa
me emprestar?
Cucaracha Si,
por supusto. (rindo) Pero no lo vas a comer!
Colega 3 Com ela tudo é possível!
Eu (furiosa) Muito
engraçadinho!
Cucaracha Y por qué están todos riendo?
Colega 1 Olha
só: é quando você entrou na sala ela ia pedir grafite ao “cu... zinheiro”.
Cucaracha Al cocinero. Pero...
Eu (gritando) Que droga, gente, vamos parar com isto
Cucaecha Usted
no está bien! Que sucedió?
Eu (em desespero) Não
aconteceu nada. Eu só preciso...
Colega 2 ...procurar o “cuzinheiro”.
Cucaracha Y donde se encontra esse cocinero?
Colega 1 Vai ver tá na cozinha.
Cucaracha Pero si no hay cocina aca!
Colega 2: Este é o grande problema. Insolúvel.
Cucaracha
desistindo de entender o que se passa sai da sala em busca do grafite e
gargalhadas estouram. Retorna, segundo depois com o grafite e uma maçã (fruta
que detesto) e me estende sorrindo.
Cucaracha Grafite para escribir y uma manzana
para solucionar tu hambre.
Eu Obrigada.
Obrigada mesmo. Mas a fome passou.
Colega 2 A fome dela passa quando tem grafite.
Novas gargalhadas explodem.
Cucaracha Están todos bromeando, verdad?
Eu Não
liga, não, Olha! Eu vou comer a maça, tá?
Estômago revirado pego a maça. Voltamos todos
ao trabalho e de repente o silêncio é cortado:
Colega 1 Alguém
tem ai à mão a rotina de calculo do DV, módulo 11?
Colega 2 Pede ao “Cu...zinheiro”.
2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário