Pelos jornais sou
informada de que um cidadão americano, professor universitário, foi o primeiro
a ter seu genoma sequenciado permitindo antever as doenças de que será vítima
provável no futuro. Sem dúvida mais um avanço da ciência e de respeito, este. Quem
sabe, num futuro nem tão distante este feito poderá permitir que se evitem ou
pelo menos que sejam diminuídos os estragos de males futuros para todos os
indivíduos.
Mas a expressão
“todos os indivíduos” me alerta para um aspecto preocupante. Vai que esta
pesquisa, visando proteção futura, seja tornada obrigatória. Será que vai ser
instituído um cartão tipo CPF, quem sabe um GDB (Genoma Pessoal Decifrado)?
Epa! Ai tem problema! Estas informações podem até ser objeto de caráter
sigiloso, mas por estas nossas paragens não há nada que garanta mais o
vazamento do que o caráter sigiloso. Ai vai dar uma confusão dos diabos.
Volto ao passado e
escuto a voz de minha avó, indagando sobre um meu namorado novo: de que
família é? O teor da resposta era indispensável para a aprovação ou não
pelo clã familiar. O sequenciamento do genoma, no futuro, modificará a pergunta
das futuras avós? Qualquer coisa como: que espécie de genoma tem este rapaz?
E vão ser possíveis diálogos estapafúrdios como: Menina! Tirei a sorte grande! Sabe aquele cara riquíssimo que estava a
fim de mim? Tem um péssimo genoma. Caso com ele que bate as botas em seguida e
eu fico rica! Artur já era, minha filha! Vou pular fora. Sabe aquela barriga
tanquinho? Vai sumir amiga! O genoma deu obesidade. Este rapaz não serve, minha
filha. O genoma do pai dele é uma droga! Vai ver tal pai tal filho! Morro de
inveja do genoma da Julieta! O meu é péssimo! A mensalidade de seu plano de
saúde vai ser triplicada. Seu genoma está classificado como altamente problemático.
Não há nada a fazer. Quem nasce com genoma torto, morre torto. Sabe a Rute?
Casou com um genoma fabuloso! Quem diria. Logo ela que tem um abaixo da crítica.
Impossível?! Sei lá eu.
Como todo avanço
científico e tecnológico esta nova descoberta trará boas e más conseqüências.
Vamos ter que conviver com um novo tipo de preconceito: o “genômico”. A cor e a opção sexual deixarão de ser motivo de segregação já que um poder mais alto se alevanta. Vai
ser um tal de falsificar genoma, sobretudo na administração pública já que o
sujeito além de atestar o patrimônio ao se candidatar a cargo da alta
administração ou a cargo eletivo, terá que revelar publicamente o genoma, a
exemplo do que se faz com a declaração de bens. E os bancos? Estes não
concederão empréstimos por tempo superior aquele em que, por vaticínio do
genoma, o individuo estará morto antes que possa saldar a dívida.
Será certamente
criado o portal do “genoma limpo” e leis proliferarão indicando a relação dos
males que não serão aceitos. A certidão de “genoma limpo”, tal como acontece
com passaportes brasileiros, passará a valer uma fortuna no mercado negro. Será
criado, no nível mundial, o IGH (Índice de Genoma Humano) e surpresas virão:
países com um baixíssimo IDH poderão apresentar um alto IGH. Pessoalmente não
tenho grandes preocupações. Aportei aos oitenta com um genoma que não deve ser
dos piores e qualquer vaticínio futuro não será, certamente, um demérito.
Afinal, nestes tempos em que as estatísticas assombram qualquer vaticínio para
mim será mais do que normal e esperável.
Fiquem, no entanto
atentos os criadores de sites de esclarecimentos a eleitores. Terão que partir
para uma simples análise combinatória visando esclarecer os cidadãos eleitores:
ficha limpa e genoma limpo; ficha limpa e genoma sujo; ficha suja e genoma
sujo; e ficha suja genoma limpo. Qual será o impacto desta classificação no
voto de, por exemplo, um cidadão hipocondríaco e ao mesmo tempo ético? Seria
preso de um angustia insuportável entre a cruz e a caldeirinha? E um
hipocondríaco não ético? Será que candidatos plenamente limpos levariam alguma
vantagem? Que dimensão teria o eleitorado dos totalmente sujos? Será que como ocorre a Ficha Limpa será espantosamente significativo?
Não vou viver para
ter respondidas estas perguntas, mas certamente o IBOPE e o Data Folha irão se
capacitar para definir a amostra que melhor concorrerá para um resultado
confiável. Será que esta nova descoberta vai provocar um revival da
eugenia? Quando este termo foi criado por Francis Galton, nos idos de 1883,
tenho certeza, era inimaginável que a tradução seu significado (bem nascido)
pudesse causar os problemas ocorridos na Alemanha Nazista e, quem sabe, os que
irão ocorrer em todo mundo nos tempos que virão em função do genoma também serão causadores de sérios conflitos. Depois de
Galton as leis de Mendel deram outro sentido à história. E agora esta! Num enfoque
não científico uma coisa é certa, vai dar uma confusão dos diabos!
2010
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