Quando era ainda adolescente este bendito fim de semana prometia o
encontro do namorado perfeito que, segundo os pais lhe haviam incutido por vezes de maneira óbvia e muito de forma subliminar, se apaixonaria perdidamente por ela.
Com ele se casaria e viveriam felizes para sempre. Afinal esta era a finalidade
da vida de uma mulher. Mas ele não aparecia. O que surgia no final da noite de domingo era a tristeza. Nos primeiros anos de pouca monta porque na segunda
feira já recomeçava o embalo criativo para o romance que se revelaria em todo
seu esplendor no próximo fim de semana.
O tempo foi passando e ela ainda esperando o fim de semana em que
encontraria o sapo que se transformaria em príncipe. Sapos existiram, é
verdade, mas permaneceram irremediavelmente sapos enquanto duraram. Até casou
com um que, meses depois, começou a traí-la com a vizinha do décimo andar. Feia
a coisa. Para suportar a ascensão ao andar mais alto ela reinventou o motivo da
separação. Ficou sendo uma decisão sua. Escamoteou o desespero das noites em
que implorou para que ele não a deixasse e inventou o fim do amor que havia
sentido nos relatos que fazia. Não era mentira, não. Era o que podia aguentar humilhada e envergonhada por ter sido traída!
E a espera pelos fins de semana foi retomada, até com entusiasmo. Mas
tempo passou e instalou-se a depressão aliada à tristeza, ultrapassando o fim
de noite no domingo. Tudo isto invadia a segunda feira e ela começou a se
perguntar: o que há comigo? Não percebia, nunca percebeu que havia se tornado
uma ameaça para os possíveis candidatos. A ansiedade que lhe atacava
evidenciada por gestos aflitos e declarações extemporâneas, os punha a correr.
Pior é que estes eram identificados em qualquer homem que, distraído, lhe
lançasse um olhar. Situações constrangedoras eram criadas e ela nem as
percebia. Mas o efeito! Ah, este se mostrava em toda sua crueza. Estava cada
vez mais só.
Foi então que começou a meter os pés pelas mãos. Resolveu ser uma
mulher “livre”! Sem ter muita clareza do que isto significava esta liberdade se
resumiu na entrega a qualquer um que buscava o momento, mas não
ela. O pior é que esta “liberdade” se misturava ao romantismo de todo um
passado de sonhos e ela descrevia estes homens baldios como perdidamente
apaixonados. Era o jeito. Isto até o momento em que desapareciam, alguns sem
dar explicação e outros as fornecendo em demasia. Por alguns dias caia na real,
mas voltava, já a caminho dos sessenta, a esperar o fim de semana.
Passou a evidenciar na estética o patético do que lhe ia por dentro.
Havia sido uma mulher bonita e agora esta beleza que certamente ainda poderia
existir era escondida pela cor de um amarelo duvidoso nos cabelos mal tingidos,
por um batom escandalosamente vermelho, por decotes absurdos e por roupas que
até mesmo uma adolescente teria problemas em usar. Na vida não havia acumulado
outros prazeres que não fossem os ligados à figura de um homem e estes, mesmo
os baldios, já não apareciam com a mesma freqüência. Os poucos que se
aproximavam sumiam de repente constrangidos pelas desesperadas caras e bocas
cuidadosamente ensaiadas para conquistá-los.
Vai daí que o prazer sumiu. A espera do fim-de-semana continuava ainda.
Sem ela a vida não seria possível. Só que durava pouco. Algumas horas apenas na
sexta à noite. Enquanto o sono não vinha imaginava acasos que fariam com que o
Homem cruzasse seu caminho. Foi ai que começou a construir uma biografia que
contava a quantos se dispusessem a escutar. Uma ficção espantosa. E, como era
impossível libertar-se do fim-de-semana, era neles que aparecia vivendo
romances tórridos de uma sedutora mulher assediada por um desfilar de homens
extraordinários, perdidamente apaixonados. Assumiu o personagem que lhe
garantia sobreviver.
Foi aí que se deu o milagre. Ou melhor, o tombo! Os extraordinários
saltos da sandália vermelha não suportaram o buraco na calçada e ela se estatelou frente à loja do turco. A dor das contusões impedia a atuação de costume e ela
apenas chorava, borrando a pintura, sandália com salto quebrado e em total
desalinho. O turco se condoeu. Carinhosamente levou-a para o fundo da loja e
entre as ferragens secou suas lágrimas. Levou-a para casa no velho carro.
No dia seguinte veio saber notícias e entrou para um cafezinho. E os
cafezinhos transformaram-se em longas conversas de início difíceis porque os
longos anos de atuação da personagem impediam o falar de verdades. Por isto
falava pouco e passou a ouvir. E foi se dando conta de que o turco não era um
sapo, nem príncipe. Longe disso. Aquele homem triste, viúvo sem filhos e feio
era apenas um homem bom. E maravilha das maravilhas parecia gostar dela. Tão
longe do modelo sonhado fazia com que se sentisse bem. Bem demais.
Ele vinha todos os dias após fechar a loja e o fim de semana deixou de
ter sentido. A espera, tão boa, acontecia de segunda à sexta. Mas casaram-se num sábado! E, segundo me contam, são felizes para sempre.
2006
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